Quilombo


Deputado do PL emprega mulher, cunhada e concunhados na Câmara


Coronel Chrisóstomo, do PL, tem união estável com Elizabeth Dias de Oliveira, a quem a Câmara já pagou mais de R$ 1,2 milhão em salários

O deputado federal Coronel Chrisóstomo (PL-RO), aliado ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), transformou o próprio gabinete na Câmara em um cabide de empregos para a companheira, uma cunhada e dois concunhados. Segundo levantamento da coluna, a Casa já desembolsou mais de R$ 2,1 milhões em salários para a família.

Sozinha, a companheira dele, Elizabeth Dias de Oliveira, abocanhou mais da metade desse valor: R$ 1,2 milhão. O casal, que vive um relacionamento discreto e longe dos holofotes, declarou manter uma união estável desde 1º de janeiro de 2022, de acordo com certidão obtida pela coluna.

Nascida em Planaltina (GO), a secretária parlamentar, de 32 anos, está lotada no gabinete desde abril de 2020, antes da formalização do relacionamento em cartório. Desde então, foi promovida até alcançar o topo da faixa salarial do cargo: a remuneração bruta chegou a R$ 18.719,88, mais auxílios.

A união estável não altera o estado civil, mas equivale em direitos e em deveres ao casamento. De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), esse modelo familiar define relações de parentesco por afinidade que podem se enquadrar em nepotismo – ou seja, o emprego de parentes de até 3º grau na administração pública.

“A união estável, instituto reconhecido como entidade familiar, nos termos do art. 226, § 3º, da Constituição Federal, e do art. 1.723 do Código Civil, estabelece relações de parentesco por afinidade que ensejam a caracterização de nepotismo”, diz enunciado do TCU firmado em julho de 2015.

Procurado, o deputado federal informou, em um primeiro momento, nessa quinta-feira (6/11), que não via problemas em empregar a própria companheira e outros familiares. Nesta sexta-feira (7/11), contudo, o parlamentar enviou uma nota à coluna dizendo ter demitido os parentes (leia a íntegra da nota ao fim desta reportagem).

Trecho de certidão de união estável de Coronel Chrisóstomo e Elizabeth
Trecho de certidão de união estável de Coronel Chrisóstomo e Elizabeth

Elizabeth levou a irmã caçula, Naara Star de Oliveira Souza Dias, para o gabinete em julho de 2022. Desde então, a cunhada de Coronel Chrisóstomo, de 25 anos, obteve R$ 386,5 mil em remunerações – com o mais recente valor bruto fixado em R$ 8.772,24. A nomeação ocorreu como Cargo de Natureza Especial (CNE), a função obriga o funcionário a bater ponto na Câmara.

No mesmo mês, a concunhada Gabriela Aparecida de Lima Oliveira entrou para o gabinete. A primeira passagem pela Câmara, de julho a outubro de 2022, começou com salário de R$ 1.991,91 como secretária parlamentar. Mas o holerite dela saltou para R$ 13.437,29 em junho de 2023, quando voltou a trabalhar com o concunhado como CNE – um aumento de 574,5%.

Gabriela, de 31 anos, vive com o mecânico Daniel Dias de Oliveira, irmão de Elizabeth e de Naara e com quem tem uma filha, desde 2016. Ao todo, os rendimentos dela na Câmara já ultrapassaram R$ 532,7 mil até o momento. Já o último salário bruto foi de R$ 16.587,50, mais auxílios.

A família, que tem raízes em Sobradinho (DF), angariou um novo integrante para o gabinete em 27 de agosto: o secretário parlamentar Luy Ferreira Sobral, de 28 anos, namorado de Naara. Assim como Elizabeth, ostenta o topo salarial.

A única remuneração disponível dele supera R$ 23,8 mil, o equivalente a um salário bruto de R$ 18.719,88, mais auxílios, referente apenas à folha de pagamento de setembro. A Câmara ainda não divulgou os contracheques de outubro e de novembro.

Arte/MetrópolesO gabinete do Coronel Chrisóstomo
O gabinete do Coronel Chrisóstomo

O Supremo Tribunal Federal (STF) veda a lotação de familiares em cargos comissionados. A união estável tornou Chrisóstomo e Elizabeth parentes por afinidade em 1º grau. A regra, porém, não se estende a Luy, uma vez que o relacionamento com Naara se trata de um namoro.

“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal”, definiu a súmula nº 13.

À coluna, a Câmara informou que tem regras próprias para nepotismo, além das regras do STF, e que o Decreto nº 7203/2010 não se aplica à Casa.

“É proibida, para exercício de Cargo de Natureza Especial, a nomeação de cônjuge, companheiro e parentes, consanguíneos ou afins, até o terceiro grau civil, inclusive, na linha reta ou colateral, de Deputados Federais, Senadores, membros do Tribunal de Contas da União e servidores ocupantes de cargos de direção, chefia e assessoramento na Câmara dos Deputado”, estabelece trecho da resolução nº 1 de 2007 da Câmara.

Esse não é o primeiro caso revelado pela coluna em que um deputado do PL emprega ao menos um parente na Câmara. A reportagem mostrou que o deputado federal Júnior Lourenço (MA) tem a sogra, Maria Jackeline Jesus Gonçalves Trovão, de 61 anos, na lista de secretários parlamentares do próprio gabinete.

O genro a nomeou em 10 de maio de 2022, com salário de R$ 1.328,41, mais auxílios. Na data, Júnior Lourenço e a filha dela, a enfermeira e nutricionista Carolina Trovão Bonfim, já haviam se casado.

Maria Jackeline recebeu uma promoção em dezembro de 2023, com salário de R$ 1.764,93, além de benefícios. O rendimento total ultrapassa R$ 3,2 mil por mês. Ao longo de 3 anos, a Câmara já lhe pagou R$ 120 mil. O parlamentar confirmou a nomeação à coluna.

O que dizem os envolvidos

A coluna conversou com o Coronel Chrisóstomo em duas ocasiões no Congresso Nacional na última quinta-feira (6/11). O deputado negou que houvesse um casamento e afastou a possibilidade de nepotismo na contratação da companheira e dos demais parentes.

Também disse que não via problema na nomeação porque todos já trabalhavam na Câmara antes da união estável, exceto Gabriela. Porém, registros oficiais da Câmara atestam que só Elizabeth entrou para o quadro do gabinete antes do relacionamento ter sido registrado no cartório.

Na data, a coluna também encontrou Elizabeth no gabinete do companheiro, no Anexo III da Câmara. Ao ser questionada sobre a contratação, respondeu: “Eu tenho o emprego que eu quiser”. A reportagem reforçou as perguntas, mas a secretária parlamentar rebateu: “Publique”.

Já nesta sexta-feira, o gabinete de Coronel Chrisóstomo informou, em nota, que Elizabeth Dias, Gabriela Aparecida Lima de Oliveira, Luy Ferreira Sobral e Naara Star de Oliveira Souza Dias não mais integram sua equipe de servidores, “que têm contribuído de forma significativa para um mandato diligente e comprometido com as causas do povo de Rondônia e do Brasil”.

“Nos últimos meses, por exemplo, o gabinete do Coronel Chrisóstomo tem sido um dos mais atuantes da Câmara dos Deputados. O parlamentar foi o relator do exitoso projeto do IOF, que poderia ter impedido o aumento de impostos, e o autor do pedido de abertura da CPI do INSS, que provocou a criação da CPMI do INSS. Na comissão, Chrisóstomo apura desmandos contra aposentados e pensionistas bem como exige a responsabilização de criminosos que atentam contra a Previdência”, diz o comunicado.

“Essa atuação assertiva do Coronel Chrisóstomo gera desconforto e a revolta daqueles que por anos seguidos lesaram importante parcela da população brasileira. Mas possíveis ameaças e retaliações por causa desse trabalho incansável não impedirão que o deputado continue protegendo aposentados e pensionistas, e fique ao lado dos rondonienses e brasileiros que clamam por justiça”, prossegue.

Procurados, Daniel, Gabriela e Naara Star não responderam até a publicação desta reportagem.

Quem é Coronel Chrisóstomo, que emprega parentes na Câmara

Natural de Tefé (AM), João Chrisóstomo de Moura se tornou deputado federal em 2018, quando ainda era filiado ao antigo PSL, partido que alçou Bolsonaro à Presidência. Reelegeu-se na Câmara em 2022, dessa vez pelo PL. O patrimônio dele saltou 180,4% entre as duas eleições, passando de R$ 302 mil para R$ 847 mil, de acordo com as declarações de bens enviadas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Coronel Chrisóstomo, de 66 anos, estampa as bandeiras “Deus”, “pátria”, “família”, “liberdade” e “pró-vida” no próprio site. Esses dizeres ampliam o lema usado por Bolsonaro – que se inspirou no slogan do movimento fascista Ação Integralista Brasileira (AIB) – e aliados durante as eleições e o governo.

A defesa quanto a Bolsonaro levou o deputado federal a reagir em 17 de julho, quando o ex-presidente se tornou alvo de uma operação da Polícia Federal (PF) com apreensão de dólares em casa. Na ocasião, defendeu a atuação das Forças Armadas em 1964, ano em que deflagraram a ditadura militar:

“Eu só quero fazer o último pedido aqui, agora, para as Forças Armadas. Eu sou das Forças Armadas, me orgulhava das Forças Armadas, me orgulhei das Forças Armadas em 1964, embora ainda fosse menino, criança. Hoje, eu quero dizer o seguinte: Forças Armadas, estejam ao lado do povo brasileiro. Estejam ao lado da democracia”, afirmou Chrisóstomo em entrevista à imprensa no Senado.

O deputado federal, criado em Rondônia, declara-se cristão evangélico e destaca a origem indígena da etnia Tukano herdada da mãe. Define-se como “defensor dos princípios do conservadorismo”, os quais também se alinham ao bolsonarismo.

No site, Chrisóstomo informou ter graduação em engenharia na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) e mestrado em Aplicações Militares. O vice-líder da oposição na Câmara construiu a carreira no Exército, onde alcançou a patente de coronel. Na reserva desde julho de 2014, recebe R$ 27.521,80 como remuneração militar.

Um ano antes de chegar a Brasília, foi nomeado como secretário de Obras, Limpeza e Urbanização em Porto Velho (RO). A carreira política começou na suplência de vereador em Lages (SC) em 2004 pelo PMDB (hoje, MDB).

Fonte: Por Coluna Tácio Lorran/Metrópoles


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