Sem compensações de ‘Samuel’, Itapuã sofre

Ainda que os impactos da construção das usinas hidrelétricas em Rondônia estejam em ampla discussão em função dos empreendimentos UHE Santo Antônio e Jirau, há 26 anos outra usina hidrelétrica no Estado começava a escrever uma história de severos impactos na vida de moradores de um pequeno distrito, a 100 quilômetros da Capital: Itapuã D’Oeste. Afetado pelo reservatório do lago formado pela UHE, o município, que abriga a primeira Floresta Nacional (Flona) licitada no País, a Jamari, padece de graves problemas de acesso, saneamento básico e até energia elétrica, potencializados pela interferência de Samuel. O Diário esteve em Itapuã D’Oeste e constatou a precariedade da condição de vida de cidadãos que saíram de vários recantos do País em busca de estabilidade e passaram a sofrer do descaso, que no mês passado levou ao bloqueio em protesto da BR-364.

Considerada um marco na História regional, a usina hidrelétrica de Samuel, cuja base operacional é em Candeias do Jamari, começou a ser construída no início da década de 1980, para abastecer o mercado local, e levou mais de 10 anos para ser concluída. Mas foi depois de pronta, que a UHE passou a ditar sobre a vida dos moradores de Itapuã. O enchimento do reservatório da usina afetou o subsolo do município e elevou o lençol freático em quatro metros na área rural, e mais cinco na área urbana.

Como consequência, a proliferação de doenças causadas por água contaminada, já que os lençóis ficaram mais suscetíveis a contaminação, se tornou um grande problema de saúde pública no município. A enfermeira Maria de Lurdes Vieira, que trabalha na principal unidade de saúde do município revela como este problema se reflete na saúde pública. “Nosso atendimento é principalmente relacionado à falta de saneamento como verminoses e doenças respiratórias”, afirma, salientando que a poeira que sobe das ruas de cascalho também é um entrave. O problema se reflete até nos sepultamentos no cemitério municipal, que já sofreu alagações.

Mas o principal anseio da população é o desfecho de um imbróglio que se arrasta há quase uma década. A conclusão de uma ponte sobre o rio Jamari, ligando os dois lados do município, que faz parte da compensação social da Eletronorte pela construção da UHE Samuel. O prefeito João Testa, explica porque o problema tem tanta projeção. “Mais de 70% do município se encontra do outro lado do rio”.

Sem ponte e sem energia de qualidade

A ponte começou a ser construída em 2002 e foi entregue em 2004 através de um convênio. No entanto, faltava um aterro que foi providenciado pela prefeitura. Com o início do aterro, parte da ponte desabou e até hoje a obra está abandonada. Um impasse judicial entre a Eletronorte e a empresa contratada para o serviço, para atribuição da causa do desabamento impede que a obra seja retomada. A equipe de reportagem do Diário flagrou a situação de risco que a ponte oferece aos moradores. Sem nenhum isolamento, a ponte é utilizada por crianças e adultos que se arriscam saltando para o rio.

Para sanar o problema, enquanto a ponte não sai, a Eletronorte contratou uma empresa para fazer a travessia de balsa, que sai a cada meia hora. A obra sem conclusão é o símbolo da frustração de quem mora do outro lado do rio, nas estradas vicinais B-40 e T-120. O agricultor Edilson Westphal, que está há 14 anos no local, reclama do abandono do Poder Público. “Aqui se alguém passar mal tem que entregar na mão de Deus, porque se for à noite não consegue atravessar”, reclama.

O paranaense José Geraldo Codeiro, conhecido na região como ‘Barbinha’, mora há 30 anos no município. “Vim ganhar a vida, para ter um pedaço de terra”, lembra.  Hoje, apesar de ter conquistado o que queria – um terreno – revela outros sonhos em relação à terra que lhe acolheu. A falta de energia de qualidade é uma das maiores expectativas do agricultor e de toda a população do município. Sem uma subestação para alimentar a rede de energia elétrica o apagão é constante, o que para os comerciantes é um risco.

Plano de reestruturação e desenvolvimento

O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) que montou um dossiê sobre os impactos ambientais e sociais sofridos que atingem o município e sobre a ineficiência de projetos desenvolvidos pela Eletronorte para mitigar tais impactos, promoveu no mês passado o fechamento da BR-364 em protesto pelas condições dos atingidos, oriundos também de Candeias e de Triunfo.

O movimento exige um plano de reestruturação e desenvolvimento dos municípios atingidos pela barragem de Samuel.

O coordenador do MAB em Rondônia, Océlio Muniz, alega que a construção da barragem de Samuel, deixou uma dívida histórica, não apenas para uma parcela da população que teve parte da propriedade atingida pelo lago. “Na visão do MAB, 100% dos municípios são atingido por barragem, já que de uma forma ou de outra, sofreram com os impactos desta obra”, diz.

Escoamento de produção prejudicado

O coordenador do MAB revela que a falta da ponte dificulta o escoamento da produção agrícola do município, que se encontra em quase 80% na margem esquerda do rio. O documento produzido pelo MAB elenca como pendência além da ponte, problemas de reassentamento de 800 famílias cadastradas e regularização fundiária de famílias já assentadas que não conseguem ter acesso a crédito.

Uma comissão composta de representantes do MAB e do governo se reuniu no último dia 31 com o ministro Gilberto Carvalho para cobrar o fim do impasse. Segundo o MAB, a Eletronorte se comprometeu em tratar do problema fora do aspecto jurídico, ou seja, conceber uma alternativa para que a ponte seja efetivada mesmo com o impasse entre a construtora e a Eletronorte. A reunião em Brasília resultou em compromissos firmados entre a Eletronorte, que se comprometeu em criar um grupo de trabalho para apresentar em 30 dias uma solução para o caso. Sobre a subestação de energia, o Ministério de Minas e Energia alegou que a conclusão da obra está prevista para o fim do ano que vem. Sobre o programa Luz para Todos, o MME apontou uma demanda de 728 ligações, sendo 606 já realizadas. O restante deverá ser efetuado com o PAC 2. Quanto aos assentamentos das 800 famílias, o Incra afirmou não ser possível a realização para este ano, já que demandaria recursos fora do previstos. No entanto, o presidente do Incra se dispôs a realizar um resgate histórico da situação dos assentados com problemas de regularização.

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